Economia da Solidão: saiba os efeitos da solidão na sociedade e como ela tem contribuído com a ampliação de negócios digitais

1/4/24
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Publicado por 
Redação Start

Especialistas em comportamento do consumidor e representantes de negócios digitais falam sobre o tema

Foto: Unsplash
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Durante a pandemia, houve um excesso de pessoas que permanecem em casa, devido às exigências e orientações das autoridades de saúde para evitar o contágio de Covid-19 em massa. Nesse período,  muitas empresas optaram por manter seus colaboradores à distância, os estudantes também passaram a fazer suas atividades escolares dentro de casa e, até mesmo, encontros e jantares passaram a ser realizados nas salas das residências.

Uma pesquisa feita pelo Kantar, líder mundial de pesquisa qualitativa e quantitativa com oportunidades de carreira em mais de 80 países, mostra que o delivery no país saltou de 80% em 2020, para 89% em 2022. Os dados revelam a quantidade de pessoas que, nos últimos anos, optaram por pedir comida em casa, ao invés de sair e ir até um restaurante. Além disso, a pesquisa mostra o quanto as pessoas buscam estar cada vez mais em casa, evitando sair e socializar e tendo apenas interações digitais. 

Fernanda Batista, especialista em comportamento do consumidor, afirma que a solidão tem um impacto significativo na sociedade contemporânea. Segundo ela, esses impactos podem aumentar as doenças, principalmente mentais, pois a solidão interfere diretamente no contato social, no qual como humanos é de suma importância para nossa sobrevivência.

Ela compartilha que a solidão pode influenciar os padrões de consumo e as indústrias relacionadas ao entretenimento e à tecnologia.

“Já são vários os apps que promovem encontros seja de namoro, amizades, até mesmo aluguel de companhia, o mercado tecnológico já oferece diversas soluções, das quais eu ainda não acredito que sejam as melhores, justamente por fazer com que esse público fique ainda mais conectado e cada vez mais distante de pessoas e possibilidades (pois muitas dessas ainda acontecem muito melhor no mundo real)”, comenta Fernanda.

Economicamente, Fernanda acredita que isso acaba abrindo espaço para ser cada vez mais explorada, principalmente no ramo turístico, para além da tecnologia, por ser um público que merece ainda mais o convívio social. 

Yuri Costa, especialista de customer experience no Hospital Sírio-Libanês, afirma que, em primeiro lugar, pode afetar a produtividade no trabalho, uma vez que indivíduos solitários podem ser menos engajados e menos eficientes. Segundo ele, são vários os estudos científicos que indicam a relação direta do isolamento com um crescente número de casos de ansiedade, depressão e também ao consumo de psicotrópicos, gerando diversos impactos diretos e indiretos em uma perspectiva econômica. No entanto, ele aponta que há diversos setores emergentes que capitalizam essa tendência, oferecendo produtos e serviços que atendem às necessidades de indivíduos solitários, podendo impulsionar a economia de certa forma.

Além disso, ele afirma que os indivíduos solitários podem recorrer a compras por impulso para preencher o vazio emocional, o que pode beneficiar certas indústrias, como o comércio eletrônico. Além disso, há um aumento na demanda por entretenimento e tecnologia que possibilitem a conexão virtual, como plataformas de streaming, realidade aumentada, redes sociais e aplicativos de relacionamento. Um outro exemplo é facilmente observado em supermercados, onde já existem opções de produtos em porções individualizadas nos mais variados segmentos de consumo.

Outro ponto, segundo o especialista, é que a solidão pode influenciar no consumo de produtos e serviços premium com mais frequência e cadência, uma vez que não há a necessidade de partilhar com outras pessoas. A solitude pode ser lucrativa se a comunicação e a estratégia de engajamento for bem adequada para o “meu momento”. Yuri destaca ainda que as políticas públicas desempenham um papel fundamental na mitigação dos custos econômicos associados à solidão, que vão desde os custos com saúde até os impactos na produtividade e coesão social. Em primeiro lugar, é essencial investir em programas de saúde mental acessíveis e de qualidade.

“Isso envolve a expansão dos serviços de saúde mental comunitários, o aumento do acesso a terapeutas e conselheiros, e a promoção de campanhas de conscientização sobre a importância da saúde mental e as consequências da solidão. Tais programas não apenas ajudam a reduzir os custos dos cofres públicos associados ao tratamento de doenças mentais, mas também podem prevenir problemas de saúde mais graves no futuro. Em resumo, políticas públicas eficazes para mitigar os custos econômicos da solidão devem ser abrangentes, abordando as necessidades sociais e emocionais das pessoas em diversas áreas da vida. Isso requer uma abordagem colaborativa entre governo, organizações da sociedade civil e setor privado para criar comunidades mais conectadas, saudáveis e, principalmente, sociáveis”, comenta Yuri.

Fernanda afirma que a economia da solidão é um "resultado" mediante "a falta de observação" das políticas públicas e que as empresas possuem o papel de estar realmente interessada em ambos, para assim desenvolver projetos e soluções.

“Eu acredito que a economia da solidão somente terá uma solução por meio do bem-estar, que muito pode ser aplicado com o desenvolvimento sustentável. Acredito mais no desenvolvimento sustentável do que na tecnologia, de certo modo tenho uma opinião de que estamos tornando tudo muito "moderno", tão moderno que estamos "esgotando" a nossa espécie humana e nos levando cada vez mais ao extremo da solidão, muitas vezes não por escolhas e sim por falta de opção”, comenta. 

Por outro lado, Luisa Dias, gerente sênior de inteligência comercial no Rappi Brasil, empresa de delivery de restaurantes, supermercados e farmácias, afirma que a solidão faz com que as pessoas busquem alternativas de entretenimento e consumo que possam ser aproveitados sem necessidade de interação com outras pessoas, frequentemente de casa, e a tecnologia é a solução mais fácil para isso. Quando sozinhos, é mais confortável assistir streaming do que ir ao cinema, pedir comida do que ir ao restaurante, leituras online do que ir até a livraria comprar com o vendedor. Na prática, as pessoas escolhem soluções que proporcionam menos interação social e mais comodidade.

“O Rappi está no Brasil há oito anos, atuando como super app de restaurantes, mercados, farmácias, e-commerce e outras verticais. Lançamos nosso programa de fidelidade, o Pro, com uma série de benefícios para os usuários que se fidelizam com a gente e aumenta a frequência dos nossos usuários. O delivery passou por um crescimento acelerado no período da pandemia e, embora tenha reduzido o ritmo, segue crescendo e ganhando penetração nas diferentes camadas da população. O mercado que antes era dominado por redes de fast food, agora já vê os parceiros mais “gourmet” ganhando espaço. Os pedidos de farmácia e supermercados passaram a fazer parte dos hábitos das pessoas, que buscam por novas propostas de valor como tempo de entrega”, compartilha Luisa.

Além disso, ela ressalta que o crescimento do Turbo, vertical de entregas rápidas do Rappi, entrada de restaurantes que antes não faziam delivery e abertura de outras verticais pelos concorrentes são indicadores claros de que a entrega de alimentos via aplicativos chegou para ficar. Segundo ela, o usuário quer conveniência e economia de tempo e nada pode proporcionar isso tão bem quanto os aplicativos de entrega. Apesar dos benefícios de entregas por aplicativo, ela compartilha que a pandemia retirou a “socialização” dos critérios de qualidade de vida dos seres humanos durante um período longo o suficiente para forçar a digitalização e mudar os hábitos de consumo e lazer. 

“Nesse período, as pessoas se acostumaram com a comodidade de ter o que quiser na hora que quiser, com um esforço mínimo. Além disso, trouxe à tona discussões sobre auto cuidado e empoderamento que aceleraram a economia da solidão. O desenvolvimento desse segmento foi fortemente impulsionado pela intensificação da economia do bem-estar, em que as pessoas passaram a valorizar mais a si próprias e descobrir formas de se sentir bem consigo mesmas. No fim das contas, é um ciclo que se alimenta: pessoas que se sentem bem, estão mais dispostas a ficar sozinhas; quanto mais sozinhas, mais elas buscam formas de pertencimento e auto-realização e encontram isso no desenvolvimento sustentável; e quanto mais elas sentem que estão contribuindo para esse fim, menos precisam de realizações sociais para continuarem bem”, comenta Luisa.

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