Incentivo à inovação na ciência e na saúde: o caminho para a transformação
Especialistas compartilham como os investimentos voltados para a pesquisa científica podem melhorar a qualidade de tratamentos e diagnósticos de doenças raras

Ao longo dos anos, a medicina e o setor de saúde vêm se transformando e mudando significativamente a maneira como são feitos os tratamentos para doenças. Isso é resultado de diversas pesquisas que contribuem com o avanço do cenário científico, melhorando a qualidade de tratamentos e diagnósticos de doenças. Mas, para que isso aconteça, é necessário que haja investimento e aporte necessário para a revolução da ciência, por meio da tecnologia.
Dessa forma, a tecnologia pode contribuir com a evolução na compreensão de doenças e no desenvolvimento de terapias personalizadas para a população. Apesar de necessário, o setor de saúde, tecnologia e pesquisa científica sofre uma grande deficiência quando depende de investimentos externos, o que acaba impactando no resultado final, que é o tratamento e a cura de pacientes. Além da automatização de processos e atendimentos médicos, que de fato podem melhorar o dia a dia da população, essas inovações não apenas tornam os cuidados de saúde mais eficientes, mas também abrem portas para novas descobertas e abordagens para o tratamento de doenças, principalmente quando se trata de casos raros.
Rodrigo Sampaio de Azambuja, executivo sênior com longa trajetória em doenças raras na indústria farmacêutica multinacional de pesquisa, explica que a situação do sistema de saúde no Brasil, quando se trata de investimentos em pesquisas científicas, tende a melhorar no médio e no longo prazo com o investimento prometido, no valor de 242 milhões de reais, pelo Ministério da Saúde em pesquisas estratégicas para o aprimoramento do SUS (Sistema Único de Saúde).
Segundo ele, o Brasil atualmente possui uma alta dependência externa dos insumos para a saúde, e o objetivo deste investimento é buscar, por meio de pesquisa científica, uma maior autonomia do SUS em medicamentos inovadores e em novas tecnologias para a saúde. Rodrigo compartilha que o investimento se dará por meio da Secretaria da Ciência, Tecnologia, Inovação e Complexo da Saúde, que destinará 100 milhões de reais para a Medicina de Precisão ou Medicina Personalizada, modalidade que considera o perfil genético de cada indivíduo, sendo extremamente importante para doenças raras, tendo em vista que 80% destas doenças têm origem genética. Ele ressalta ainda que os outros 20% são de cânceres raros e infecções raras.
Além disso, Rodrigo esclarece que poderão ser desenvolvidas no Brasil terapias avançadas como a terapia gênica, a terapia celular, a bioinformática e o aumento do número de pesquisas clínicas, impactando positivamente a vida de pessoas com doenças raras e pessoas envolvidas, beneficiando a população alvo com o lançamento de novas tecnologias, baseadas em evidências científicas.

“Estima-se que, hoje, no Brasil haja aproximadamente 13 milhões de pessoas com algum tipo de doença rara, sendo que existem em torno de 8 mil tipos destas doenças catalogadas no mundo, representando aproximadamente 6% da população. É um ecossistema de saúde extremamente complexo e com uma demanda crescente onde há vários casos subdiagnosticados. No Brasil, temos uma Política Pública Nacional de Atenção Integral às Doenças Raras (Portaria 199) desde o ano de 2014. Contamos com 17 centros de referência habilitados pelo Ministério da Saúde espalhados pelo país para o atendimento de pessoas com doenças raras e outros 20 centros estão em análise para se credenciarem”, comenta Rodrigo.
Roberto Giugliani, médico geneticista e cofundador da Casa dos Raros, afirma que, de uma maneira geral, os investimentos em pesquisa ainda são limitados e muito abaixo das necessidades. Apesar disso, o médico compartilha que um dos principais gargalos enfrentados é a falta de continuidade a longo prazo dos programas de incentivo à pesquisa, que acabam paralisando processos que poderiam contribuir significativamente para o futuro da ciência no Brasil. Ele afirma que o país passou por momentos em que houve bons investimentos voltados para o setor, mas que acabaram se perdendo ao longo do tempo devido à escassez de recursos.
Atualmente, o médico afirma que é possível observar um novo momento de luz para novos investimentos, mas ressalta que é necessário que tenham continuidade para de fato avançar. Segundo ele, os programas de pesquisa precisam ser uma política de estado mais do que uma política de governo, pois os resultados só aparecem a longo prazo. Sobre pesquisas voltadas para doenças raras, Roberto esclarece que o setor vem enfrentando grandes desafios não só no Brasil, mas em todas as partes do mundo, visto que o número de pessoas portadoras de cada doença considerada rara é uma pequena parcela da população.

“Como o custo de desenvolvimento de um tratamento é praticamente o mesmo se tiver 10 mil ou 10 pacientes com a doença, é natural que as companhias farmacêuticas se interessem mais pelas doenças com maior número de pacientes. Assim como é importante que o setor público e privado incentivem as pesquisas voltadas para essa população, também é importante que as associações de pacientes se envolvam com o processo de incentivo às pesquisas e captação de recursos. A população com menos recursos enfrenta muitas dificuldades para o processo de diagnóstico, uma vez que as consultas e exames necessários demoram muito tempo para serem realizados pelo SUS”, aponta Roberto.
Além do diagnóstico, Roberto esclarece que ainda existem dificuldades para obter a abordagem multiprofissional, recomendada para a maioria das doenças raras. Assim, ele explica que é necessário abreviar a jornada do paciente até o diagnóstico e incentivar equipes para proporcionar qualidade, clareza e humanização em cada situação, que pode ser estimulada pelas associações de pacientes.
Rodrigo afirma que o Ministério da Saúde não investe com velocidade suficiente em meios de diagnóstico e que o número de profissionais especializados necessários para avaliar os pacientes é pequeno, o que acaba impactando na demora para obter um diagnóstico assertivo e em filas enormes de espera para os atendimentos no SUS.
Rodrigo aponta que o Rio Grande do Sul, por exemplo, conta com centros especializados voltados para pesquisa e tratamento de doenças raras, como o Hospital de Clínicas de Porto Alegre, centro de referência credenciado em doenças raras, e a Casa dos Raros, instituição pioneira na América Latina na exclusividade de atividades em doenças raras. Ele afirma que ambas instituições disponibilizam a atenção de especialistas e de equipes multidisciplinares para estes pacientes e treinamentos para os profissionais da área, além do desenvolvimento de pesquisas de ponta, com apoio do Governo do Estado do Rio Grande do Sul, por meio da Secretaria Estadual de Saúde.
Segundo Roberto, a Casa dos Raros surgiu da constatação de que, apesar do Estado ter alguns excelentes serviços de referência nesse sentido, a situação dos pacientes e famílias ainda é difícil, com uma demora significativa para obter uma avaliação, fazer exames, chegar ao diagnóstico e, posteriormente, iniciar o tratamento.
“Era preciso fazer algo diferente. A partir daí, desenhamos o projeto da Casa dos Raros, onde teremos um uso intensivo de telemedicina e avaliações coordenadas de modo a minimizar os deslocamentos e a reduzir a jornada do paciente até o diagnóstico. Vamos instituir rapidamente o manejo multidisciplinar mais adequado, o qual deverá ser realizado perto da residência do paciente, fornecendo o treinamento necessário aos profissionais envolvidos que precisarem”, comenta.
O futuro da inovação científica
Com relação ao futuro da inovação científica para esse público, Rodrigo esclarece que hoje existem no mundo todo em torno de 500 pesquisas clínicas em andamento para diversos tipos de doenças raras. Segundo ele, o melhor caminho para o futuro é a parceria público-privada, com transparência, sempre envolvendo o meio acadêmico e com possibilidades do intercâmbio de conhecimento internacional, onde os nossos pesquisadores sejam valorizados e bem remunerados para permanecerem trabalhando aqui no Brasil.
Rodrigo aponta ainda que esse processo pode desenvolver tecnologias inovadoras para a medicina e que estas descobertas científicas podem ser compartilhadas e aplicadas na cura e/ou em tratamentos para diversas outras patologias, proporcionando uma melhor qualidade de vida, gerando a esperança e a longevidade de forma saudável, ao maior número de pessoas possível.
Roberto complementa que a inovação é um componente importante tanto para o diagnóstico, quanto para o tratamento de doenças raras. Ele esclarece que ações coordenadas envolvendo pesquisadores, associações de pacientes, setor público e setor privado são essenciais para o país avançar nessa área.
“O incentivo e o investimento em pesquisa científica são como combustível para a evolução. Vamos lá! Imagine um mundo sem pesquisa científica. Não teríamos avanços médicos, tecnológicos, ambientais ou praticamente em qualquer área. O incentivo e o investimento em pesquisa são fundamentais por várias razões. Em resumo, o incentivo e o investimento em pesquisa científica são investimentos no futuro. Eles geram conhecimento, melhoram a qualidade de vida, impulsionam a economia e nos capacitam a enfrentar os desafios complexos que o mundo apresenta. Essa é uma aposta que vale a pena fazer”, conclui.