MEI x CLT: entenda as particularidades de cada formato de contratação
Especialistas abordam os benefícios e desafios de cada modelo de contratação e como eles podem se alinhar com os objetivos da empresa e do trabalhador
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Caracterizadas como duas maneiras de contratação com diferentes obrigatoriedades e especificações, o MEI (Microempreendedor Individual) e o CLT (Consolidação das Leis do Trabalho) têm estado em pauta por parte das empresas contratantes. Ambas formas de trabalho possuem suas vantagens e desvantagens, mas muitos trabalhadores desconhecem suas especificações e buscam compreender quais seus benefícios, para saber qual modelo optar na hora de ser contratado por alguma empresa. Para simplificar o tema, a equipe da redação Start conversou com dois especialistas sobre o assunto.
A contadora Samyra Mota, responsável pelas redes sociais @fiscalsemprejuizo, explica que, inicialmente, o CNPJ na categoria de microempreendedor individual é uma categoria de empresa simplificada, que possui benefícios para os empreendedores que optam por este regime em relação às demais categorias de empresa. Além dos benefícios previdenciários, Samyra destaca que o MEI possui um baixo custo tributário mensal, visto que a sua guia de recolhimento de impostos é em um valor fixo por mês com base no salário mínimo, não sofrendo variações de acordo com o faturamento da empresa. Outro ponto que chama bastante atenção dos empreendedores é a simplificação em relação às regras fiscais e contábeis.
Segundo Samyra, o MEI não é obrigado a emitir notas fiscais para todas as operações, exceto em alguns casos, não é obrigado a ter contabilidade e não é obrigado a ter conta pessoa jurídica. Apesar dos benefícios fiscais, ela destaca que o MEI também possui desvantagens em relação a outras categorias de empresas. Segundo ela, uma empresa enquadrada como microempreendedora individual, possui limitações em relação ao faturamento da empresa como também nas compras. Já o MEI só pode faturar até R$81.000,00 anualmente e comprar até 80% deste valor.
Caso ultrapasse algum dos pontos, deverá realizar o desenquadramento da categoria. Além do faturamento, ela destaca que o MEI também se limita em relação às atividades que podem ser exercidas. Neste sentido, algumas profissões e atividades precisam se formalizar em outras categorias por essa limitação na legislação. Por fim, e não menos importante, Samyra destaca que o MEI não possui uma separação fiscal e financeira do CNPJ com o CPF, que resulta na responsabilidade do empreendedor ou empreendedora como pessoa física nas questões fiscais da empresa.

“Como uma das principais vantagens do MEI, a forma de tributação é simplificada e o MEI recolhe mensalmente uma guia de impostos unificada em um valor fixo mensal de acordo com as suas atividades. É por meio da famosa Guia DAS que o MEI recolhe o INSS, ICMS e ISS, sendo: R$70,60 referente a contribuição previdenciária, INSS (Salário mínimo *5%); R$1,00 referente ao imposto sobre a circulação de mercadorias sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação, ICMS; R$5,00 referente ao imposto sobre serviço, ISS. O optante pelo MEI é isento de IRPJ, CSLL, contribuição para o PIS/Pasep, COFINS, IPI (exceto se incidentes na importação) e contribuição previdenciária patronal (exceto se contratar empregado)”, comenta Samyra.
Além dessas especificações e obrigatoriedades, Samyra destaca que o MEI deve emitir notas fiscais quando vende para pessoa jurídica ou quando a pessoa física exigir, pagar mensalmente a guia DAS, enviar a declaração anual de faturamento, enviar o imposto de renda pessoa física nas situações em que estiver obrigado e enviar a REINF em casos de distribuição de lucros ou retenção de impostos.
Em comparação, Ariel Stopassola, sócio-administrador do escritório Stopassola Advocacia, explica que existem muitas vantagens de ser contratado via CLT, como os direitos mínimos previstos na Constituição Federal destinados ao modelo de trabalho devido a segurança de um patamar mínimo de direitos e o risco do negócio não pode ser transferido ao funcionário. Enquanto o trabalhador celetista, o ônus recai no empregador. Se o faturamento da empresa vai mal, o salário e demais vantagens do colaborador estarão, em regra, preservados.
Em resumo, Ariel destaca que o trabalhador terá certa estabilidade financeira, porque lhe são assegurados, o salário mínimo mensal, 13° salário e férias anuais remuneradas, FGTS e seguro desemprego em caso de despedida involuntária, horas extras quando prestadas além do regime contratado ou acima do limite legal (8h diárias e 44h semanais). Ele afirma que, naturalmente, o trabalho em regime CLT já é mais engessado do que aquele contrato entre duas pessoas jurídicas, e na condição de celetista, o trabalha estará subordinado aos comandos do empregador, devendo acatar ordens, cumprir horários, muitas vezes sem ingerência sobre o próprio serviço.
Outro ponto que também influencia bastante na escolha do trabalhador entre os regimes MEI e CLT, é a remuneração, que na maioria dos casos é fixa, exceto em situações onde há comissionamento, salário por tarefa, por produção e outras modalidades permitidas em lei. Portanto, a subordinação, a ausência de liberdade de horário e salário fixo são fatores que podem ser vistos como desvantagens do trabalhador celetista, se comparado ao MEI.
Com base no art. 3° da CLT, Ariel afirma que, antes de tudo, para um trabalhador ser considerado MEI, a relação dele não pode preencher os requisitos impostos no documento, como subordinação, habitualidade, onerosidade e pessoalidade. Caso contrário, o regime de trabalho poderá demonstrar um vínculo empregatício, e não de microempreendedor individual.

“A subordinação pode ser evidenciada de diversas formas. A mais comum é quando o trabalhador está diretamente subordinado ao poder diretivo do empregador, recebendo ordens, não tendo ingerência sobre a forma da prestação de seu próprio trabalho. A não eventualidade se verifica quando há prestação de serviços frequentes, rotineiros, habituais, inseridos na rotina da empresa. A onerosidade é requisito comum; tanto o MEI, quanto o trabalhador CLT são remunerados. Por fim, a pessoalidade se configura quando a empresa celebra o contrato diretamente com determinada pessoa natural. Ela não pode se fazer substituir. Caso falte ao serviço, não poderá indicar um conhecido ou outra pessoa que tenha conhecimento dos serviços”, comenta Ariel.
Segundo Ariel, o MEI pode conter até 3 desses requisitos, mas não os 4 de forma simultânea, sob pena de ser enquadrado como trabalhador celetista. Bem compreendidos os requisitos, a principal diferença reside na liberdade (ou falta dela): deve haver autonomia para o MEI e subordinação para o celetista.
“Não se pode pretender o “melhor dos mundos”: contratar o MEI (para reduzir encargos trabalhistas/previdenciários) e exigir a subordinação como se empregado fosse. Essa prática pode caracterizar fraude (art. 9.o da CLT), lembrando que a regularidade documental pode ceder diante da realidade”, ressalta.
Como MEI, o trabalhador tem como benefícios a liberdade de horário, remuneração mais elevada, prestação de serviços sem exclusividade e maior autonomia na prestação do trabalho. Além disso, Ariel destaca que o MEI pode ter empregado (art. 18-C, da LC 123/06), ou seja, na condição de empresário pode transferir o trabalho a um subordinado.
Ariel aponta que um dos maiores desafios para o trabalhador que opta pelo regime de MEI, é enfrentar o mercado de trabalho, ao se deparar com empresas que buscam a contratação MEI para mascarar um vínculo de emprego, para se abster de encargos trabalhistas e previdenciários. Segundo o especialista, os profissionais acabam acreditando na maior liberdade de horário, salário variável ou ingerência sobre o próprio serviço. Porém, em casos como esse, o microempreendedor individual poderá ver seus direitos trabalhistas reduzidos ou suprimidos, gerando um desequilíbrio na relação capital x trabalho: não trabalha e nem recebe como MEI, e não possui os direitos do empregado celetista.
“É importante lembrar que muitos profissionais MEI acabam tendo jornada de trabalho excessiva, sem a remuneração correspondente, especialmente nos casos em que há um vínculo de emprego “mascarado”. Por isso, é necessário que o profissional reflita sobre seus maiores objetivos, como estabilidade financeira ou risco visando mais liberdade. Não bastando isso, é importante conhecer a empresa para qual quer prestar seus serviços e verificar se, de fato, estará trabalhando como um celetista - recebendo todas as vantagens constantes na CLT- ou se como verdadeiro microempreendedor individual, tendo liberdade de horário ou livre de controle hierárquico, etc. Para o empresário (tomador de serviço), um alerta importante: a contratação do trabalhador pela MEI não lhe isenta de encargos trabalhistas, se ficar comprovada a subordinação do prestador dos serviços”, ressalta Ariel.
Ambos os profissionais destacam que o profissional deve estar ciente que são papéis diferentes, um com regime de trabalho com vínculo empregatício, o outro é uma relação comercial entre duas empresas.
Falando ainda dos trabalhadores celetistas, Ariel destaca que a última Reforma Trabalhista, que ocorreu no ano de 2017 (Lei 13.467), dificultou direitos importantes, como a equiparação salarial e suprimiu outros, como a indenização pelas horas de intervalo intrajornada (horário de almoço), que agora não mais são pagas como horas extras. Atualmente, essa verba possui natureza indenizatória, não impactando em outros direitos trabalhistas, como 13° salário e férias por exemplo.
“O Supremo Tribunal Federal entendeu ser constitucional eventuais ajustes entre Sindicatos (acordos e convenções coletivas) que suprimam ou restrinjam direitos fixados na própria CLT - é o que ficou definido no Tema 1.046 do STF, desde que mantidos os direitos absolutamente indisponíveis. Portanto, há uma tendência neoliberal de redução de direitos trabalhistas com o passar dos anos, especialmente em decorrência do posicionamento do STF. No que se refere ao microempreendedor individual, diversas decisões dos Tribunais Brasileiros estão validando a contratação de trabalhadores autônomos, ainda que preenchidos os requisitos do vínculo de emprego. Portanto, muitos microempreendedores individuais, mesmo com “relação de emprego mascarada”, não tiveram êxito no reconhecimento de seu pedido de vínculo empregatício. É o que se verifica, por exemplo, na ADPF n° 324 do Supremo Tribunal Federal”, comenta Ariel.