Quais as perspectivas para a indústria de games em 2025?
Brasil se destaca como o décimo maior mercado de games do mundo, impulsionado pela nova regulamentação e incentivos que valorizam a produção local e fomentam a inovação no setor

Nos últimos anos a indústria de games se concentrava nos pólos de inovação mundial, lugares conhecidos pelo alto investimento em tecnologia e inovação, como Estados Unidos e Japão. As grandes empresas que fazem parte da indústria estavam localizadas nesses lugares e tudo girava em torno da região. Porém, em meados dos anos 90 e início dos anos 2000, o mercado foi se expandindo e chegando em lugares como o Brasil. Em uma matéria publicada pelo portal Carta Capital, se mostra inegável que o setor possui um faturamento significativo para o mercado, movimentando cerca de 200 bilhões de dólares em todo o globo.
A matéria mostra que, em 2023, o Brasil se destacava como o décimo maior mercado de games do mundo, com mais de 100 milhões de jogadores. Nesse contexto, visando uma análise de mercado, Lia Fuziy, presidente da IGDA SP e coordenadora do GameDev ToolKit, Juno Cecilio, CEO da Gixer Entertainment, e Carlos Silva, CEO & Head of Gaming, profissionais que atuam no setor de games, falam sobre as perspectivas de mercado e como ele se comportará nos próximos anos.
Com base na regulamentação do setor no Brasil já em andamento, Lia destaca que a expectativa é que haja uma maior valorização do mercado interno. Em entrevista, ela cita a Pesquisa Game Brasil (PGB) de 2024, que mostra que 73,9% das pessoas indicam o consumo de jogos eletrônicos, representando um aumento em relação aos 70,1% de 2023. Segundo ela, se o mercado permanecer no mesmo ritmo, o Brasil poderá alcançar uma taxa de consumo de 78% a 80%, o que impulsiona a produção local e fomenta o desenvolvimento de jogos que refletem a cultura brasileira, criando oportunidades econômicas e incentivando a inovação e criatividade no setor.
Ela explica que as tecnologias emergentes devem ter um grande impacto nas produções e no processo produtivo, como a inteligência artificial (IA) e o machine learning, tecnologias que proporcionam os NPCs (personagens não jogáveis) mais inteligentes e com diálogos mais naturais, como visto em mods de jogos como Skyrim, que usam ferramentas como ChatGPT. Além disso, ela destaca o uso de realidade aumentada e realidade virtual como uma grande evolução dos jogos.
“A realidade aumentada (AR) está se tornando cada vez mais acessível, integrando-se facilmente a dispositivos móveis e oferecendo experiências imersivas em jogos como Pokémon Go e filtros para redes sociais. No entanto, jogos de VR que necessitam de equipamentos como óculos Rift ainda estão fora do alcance de uma grande parcela da sociedade devido ao alto custo. Apesar disso, esses jogos promovem experiências únicas e incomparáveis, e à medida que os custos diminuem, espera-se que mais jogadores possam acessar essa tecnologia, expandindo ainda mais suas possibilidades de uso”, comenta Lia.
Juno Cecilio explica que criar games está cada vez mais caro por conta da alta demanda da tecnologia, enquanto as empresas estão cada vez menos capitalizadas por conta da alta taxa de juros dos EUA. Com isso, ele acredita que cada vez menos jogos AAA estarão disponíveis no mercado no curto prazo, e que muitos investidores acreditam nas IAs generativas como ferramenta para acelerar o processo de criação de games, enquanto a grande maioria dos profissionais da indústria tem se mostrado veementemente contra, por conta da falta de regulamentação.
Segundo ele, as empresas também estão fechando as portas, e demitindo funcionários em massa e, com isso, desenvolvedores independentes formados por 20, 10, 5 ou às vezes por apenas um desenvolvedor solitário, podem tomar frente nesta competição acirrada do desenvolvimento de games premium, ou seja, jogos com um único valor e validade infinita, como cartuchos e games de disco.
Juno aponta que, antes, os grandes publishers eram a principal voz para os jogadores finais, e agora passaram a perder espaço para os streamers, que estão começando a atuar como publicadoras de jogos. Ele explica que esses streamers têm se mostrado mais interessados em dar destaque para títulos independentes, que sem sua ajuda iriam naufragar esse mar cheio de grandes lançamentos, o que mostra que os jogos independentes terão mais aderência no mercado.
“Estamos próximos do anúncio de um novo console da Nintendo, que será lançado em 2025. A Nintendo já possui tradição em se reinventar e ao mesmo tempo revolucionar toda a indústria de jogos de videogame ao apresentar seus hardwares inovadores. Nem sempre foram acertos mercadológicos, mas praticamente todas as iterações de hardware da chamada "BIG-N" trouxeram algum tipo de inovação para a maneira como percebemos e consumimos jogos, seja com controles de movimento, seja vendendo papelão (sim, literalmente papelão) com o Nintendo LABO. Então se eu fosse apostar em uma tecnologia pensada primordialmente para jogos, apostaria nas inovações da Nintendo. Agora é torcer para que aconteça uma nova revolução, em vez de uma simples revisão do que já temos no mercado”, conta Juno.
Carlos Silva destaca que atualmente existem plataformas e franquias muito bem estabelecidas no mercado e para os consumidores. Por esse motivo, ele acredita que o smartphone seguirá sendo uma plataforma relevante por ter uma maior capilaridade e acesso, mas os jogos via streaming devem chegar em breve. Segundo ele, existem questões técnicas sobre como essa experiência poderá ser consumida, já que um jogo exige equipamentos e hardwares bons, além da conectividade, mas é uma tendência de longo prazo, considerando que o mercado da música e do audiovisual também passaram por isso.
“A tecnologia é um aliado importante na experiência de jogos digitais, e o que temos hoje através do console, computador e smartphone devem continuar evoluindo e consequentemente engajando os jogadores. Mas as experiências em VR, Realidade Aumentada, apesar de serem de menor impacto midiático, podem evoluir ao longo do tempo. Vejo como tecnologias que podem agregar para os jogadores, mas existem questões que distanciam o público como o preço e até mesmo a quantidade de produtos ofertados. Existe o movimento de algumas grandes publicadoras como a Sony/Playstation e da Meta com o Meta Quest, e que tem apresentado evoluções importantes das suas tecnologias. O próprio Vision Pro da Apple deverá ser um produto que pode evoluir em sua segunda versão, considerando games um pilar dessas mudanças”, aponta Carlos.
Ele aponta que o maior desafio é tentar adequar uma agenda de lançamentos com bons produtos, pois atualmente temos um alto volume de jogos e boa parte deles não são bons do ponto de vista de mecânicas e jogabilidade. Atualmente, os consumidores de jogos digitais são muito diversos, e por esse motivo as oportunidades são muito amplas, tanto para faixas etárias diferentes, quanto para gêneros.
“Isso abre para muitas possibilidades, mas é importante considerar que os jogadores são muito ativos em canais digitais e de comunidades. Com isso, é fundamental compreender essas necessidades e o que motiva aquela audiência para que isso possa ser refletido nos jogos digitais. Podemos dizer que o engajamento com jogos digitais é muito positivo. Atualmente 73,9% das pessoas no Brasil jogam jogos digitais, e esse entretenimento já é algo presente na cultura dos brasileiros, considerando que esse percentual é consistente há mais de 10 anos. O que considero uma nova frente são as marcas não endêmicas, cada vez mais presentes com produtos, serviços e procurando formas de se conectar com o público de games. Aqui temos oportunidades muito boas de novos negócios para ambas as partes”, conclui Carlos.
Do ponto de vista de Juno, as condições da indústria e a geopolítica mundial tem muita influência no setor. Por esse motivo, a Gixer Entertainment está sempre analisando o mercado para entender qual o caminho mais seguro para os seus títulos.
“Atualmente a indústria está esperando menos títulos grandes num futuro próximo. Nossa estratégia então é justamente nadar contra esta maré. Estamos trabalhando no título Changer Seven, game para PC e Consoles inspirado em heróis japoneses como Jaspion e Flashman. Queremos colocar a janela de lançamento deste game no mercado justamente quando a maré estiver baixa, para ganhar destaque que possivelmente não teríamos se o mercado estivesse mais aquecido", destaca Juno.
Já para Lia, questões como a regulamentação do setor de jogos, programas de incentivo como a Lei Paulo Gustavo e ProAC têm a tendência de criar um ambiente mais favorável para o crescimento da indústria, atraindo investimentos, formalizando o setor e garantindo a proteção dos direitos de desenvolvedores e jogadores. Segundo ela, por meio da regulamentação as empresas brasileiras terão mais facilidade para obter dev kits, e o outsourcing para empresas externas continuará em alta. Além disso, ela aponta que a gamificação e o uso de jogos como ferramentas de treinamento em diversas áreas apresentam grandes oportunidades de inovação e crescimento para desenvolvedores e empresas.