Estiagem de 2024 no Norte do Brasil: o que esperar e como se preparar?

14/6/24
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Publicado por 
Redação Start

A seca severa ameaça repetir os impactos devastadores de 2023, com previsões de chuvas abaixo da média e medidas emergenciais em curso para minimizar os efeitos da crise

Igarapé Tumbira, perto de Anavilhanas, seca em 2023 (Foto: Divulgação)
Igarapé Tumbira, perto de Anavilhanas, seca em 2023 (Foto: Divulgação)

Proporcional ao volume de chuvas que atingiram a região sul do Brasil no último mês, muitos pesquisadores têm noticiado que a região norte do país sofrerá com uma estiagem ainda pior que a de 2023 este ano. A situação tem causado preocupações a muitos setores da economia, ao poder público e à própria população que vive nesta região, visto que a seca do ano passado causou uma série de problemas para o Estado do Amazonas. 

Uma matéria publicada pela Folha de São Paulo em outubro de 2023 mostra que a seca extrema causou a morte de animais nos rios, isolamento de comunidades ribeirinhas, falta de água, dificuldades no transporte fluvial, queimadas, interrupção na produção de energia e problemas de saúde para a população local. Essas situações extremas, mesmo que opostas à seca, também se estendem para outras regiões do país. Um exemplo disso é a catástrofe climática que atingiu a região sul do Brasil, deixando 175 mortos confirmados, 38 pessoas desaparecidas, e cerca de 800 pessoas feridas durante as enchentes.

Os moradores da capital amazonense, Manaus, relataram que, devido à seca, as bombas de abastecimento de conjuntos residenciais estavam trabalhando mais do que o normal para abastecer as casas. O geógrafo e ambientalista Carlos Durigan, que há mais de 20 anos vive e atua na Amazônia, compartilha que em 2023 uma junção de fatores levou a Amazônia a viver um cenário crítico de seca extrema. Basicamente, a região sofreu severamente com as consequências do fenômeno El Niño, unido às consequências do aquecimento global e do aquecimento anormal do Atlântico, que influenciou a circulação atmosférica e a umidade sobre a região. 

O pesquisador explica que este cenário tem se amenizado nos últimos meses, mas ainda causou um efeito sobre o período chuvoso do primeiro semestre, que então com menos chuvas, não permitiu uma cheia forte dos rios, que apresentam agora níveis abaixo da média. Segundo ele, apesar das previsões serem de que o fenômeno esteja se arrefecendo, há preocupações de que por conta do nível dos rios abaixo da média, a estiagem leve a uma vazante também acentuada e isso pode causar dificuldades em toda a região. Além disso, ele destaca que as queimadas também podem contribuir para que o cenário seja ainda pior, com previsões de que a temperatura média global se mantenha acima do limite crítico de 1,5 o C.

“Instituições e especialistas que monitoram o clima global ainda não estabeleceram uma certeza sobre o cenário que aguarda a região Norte na estação seca de 2024. Mas há dados que levam a um entendimento que já há um abrandamento do efeito do fenômeno El Niño extremo em curso desde 2023, que apesar de estar arrefecendo, tem influenciado o período chuvoso atual e com isso as cheias sazonais dos rios que ocorrem até junho anualmente, devem ficar em um patamar abaixo da média. No entanto, por conta do cenário de aquecimento global e mesmo do efeito que persiste desde o ano passado, podemos sim viver um cenário similar de vazantes dos rios e isso levando a um cenário de dificuldades em toda a região. Assim a palavra de ordem à gestão pública e a sociedade neste momento deveria ser de atenção, de estarmos preparados para cenários complexos e de dificuldades que requerem ações preventivas e ações de adaptação aos mesmos”, comenta Carlos.

Ele aponta que há um clima de preocupações, não só sobre quem vive em comunidades indígenas, rurais e ribeirinhas, mas também pela população urbana. Segundo ele, ainda há um sentimento de que temos avanços importantes na região de controle sobre o desmatamento, mas ainda há muito o que se fazer para consolidar uma agenda de políticas de adaptação e prevenção e mesmo de preparação a ações emergenciais quando necessárias. O cenário se intensifica ainda mais por estarmos em ano eleitoral municipal no Brasil, onde os políticos passam a se engajar muito mais em suas próprias campanhas do que para pautas ambientais e climáticas que, obviamente, não é uma prioridade para boa parte dos políticos.

“Infelizmente as previsões são negativas. Já éramos para estarmos vivendo um cenário de ações globais de contenção das emissões e o que vemos é o contrário, vivemos um aumento expressivo das emissões e nenhum sinal de políticas firmes de mudança do quadro global. O que países gastam de tempo e recursos fazendo guerra ou apenas mirando crescimento econômico baseado em atividades degradantes social e ambientalmente, se empregado a ações voltadas à redução de emissões com o estabelecimento das agendas já estabelecidas nas convenções globais, teríamos maiores esperanças por um futuro mais positivo”, diz Carlos.

O Secretário Executivo Cel. BM Francisco Máximo, Secretário Executivo da Defesa Civil do Amazonas, afirma que, neste ano, podemos esperar uma estiagem mais breve, com duração de três a quatro meses, porém intensa devido às projeções que apontam para uma influência significativa no regime de chuvas de agosto a outubro. Isso tenderá a afetar o padrão de precipitação, reduzindo o volume de chuvas.

“Observamos chuvas abaixo da média em junho, julho e agosto, especialmente no sul do Amazonas, e outras previsões indicam que grande parte do estado também terá chuvas abaixo do normal. É importante ressaltar que o Amazonas ainda lida com os efeitos da seca histórica do ano passado, ou seja, o nível dos rios ainda não se recuperou completamente, mesmo durante a estação chuvosa os níveis de algumas calhas continuam abaixo da média, resultando em déficit hídrico. Não se espera uma seca prolongada, mas sim um trimestre seco e intenso. Tanto a seca quanto as chuvas escassas no sul do país são eventos extremos que requerem atenção e planejamento adequados”, compartilha Cel. Máximo.

Ele destaca que a situação hídrica é fortemente impactada devido à escassez de chuvas, que interrompe o fluxo dos rios, afetando diretamente a mobilidade das comunidades que dependem dessas vias fluviais. Além disso, ele aponta que a vegetação se torna cada vez mais vulnerável às secas frequentes, sem tempo suficiente para se regenerar. Para minimizar os efeitos das secas para a população local, ele compartilha que a Defesa Civil do Estado tem realizado desde janeiro reuniões com setores como indústria e comércio, poderes públicos, empresas de telecomunicações e concessionárias de água e energia para fornecer informações e coordenar ações de prevenção diante da possibilidade de outra severa estiagem em 2024. 

Segundo o Secretário, no dia 9 de maio, o governador Wilson Lima anunciou a emissão de licenças ambientais para a dragagem em quatro trechos de rios do Amazonas e destacou que o Governo do Estado tem agido de forma antecipada para minimizar os impactos da estiagem deste ano, cuja previsão é de que seja tão ou mais intensa quanto a de 2023. Ele explica que o trabalho de dragagem será feito pelo Governo Federal, por meio do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit), com previsão de início imediato a partir da emissão das licenças.

“A dragagem atende um pleito do governador que desde o início do ano vem se reunindo com ministros de Estado, a exemplo dos ministérios de Portos e Aeroportos, de Integração e Desenvolvimento Regional e de Meio Ambiente e Mudança do Clima, solicitando apoio na antecipação de ações. O serviço de dragagem consiste na retirada de sedimentos (como areias e outros materiais) do fundo dos rios para facilitar a navegação de embarcações e evitar que encalhem. Entre os trechos que receberam as licenças ambientais, emitidas pelo Instituto de Proteção Ambiental do Amazonas (Ipaam), estão: Manaus-Itacoatiara (rio Madeira); Codajás-Coari e Benjamin Constant-São Paulo de Olivença (rio Amazonas) e Benjamin Constant – Tabatinga (rio Solimões)”, destaca o Secretário.

Cel. Máximo ressalta que o Governo do Amazonas estabeleceu o Comitê Intersetorial de Enfrentamento à Situação de Emergência Ambiental, com o objetivo de coordenar as ações dos órgãos responsáveis com foco na preservação de vidas, redução de impactos, conservação do meio ambiente e dos sistemas coletivos, o estímulo à economia nos municípios afetados, a restauração da normalidade social e a prevenção de futuros desastres. Segundo ele, a Defesa Civil do Estado também vem intensificando a implementação de medidas preventivas e o uso racional de recursos naturais para a população dos municípios que residem em áreas de risco, com o objetivo de minimizar os impactos da estiagem neste ano no estado. 

Além disso, ele aponta que a própria população deve se manter engajada para se prevenir e buscar reduzir os impactos em ações de fácil reprodução, como se manter informado com informações oficiais sobre a estiagem e alertas de emergência, seguir sempre as orientações das autoridades locais para garantir a segurança pessoal e comunitária e praticar o uso racional de água e energia. Outras ações que ajudam a causa é manter aparelhos que não estão em uso desligados, optar pelo uso de lâmpadas de baixo consumo para economizar energia, armazenar água potável, fechar torneiras, consertar vazamentos e reutilizar a água sempre que possível. 

“Entre as iniciativas está o Projeto Água Boa, ação da Defesa Civil do Amazonas que até o momento já distribuiu cerca de 500 purificadores de água nas comunidades do interior do estado. Essa ação visa garantir o acesso à água potável e contribuir para a saúde e bem-estar das populações locais, especialmente durante os períodos de estiagem, quando a escassez de água potável se torna mais crítica”, completa o Cel.

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