Investimentos de impacto: transformando o mercado com inclusão e sustentabilidade
Empresas e investidores estão mudando a lógica do mercado ao apoiar startups e projetos que combinam retorno financeiro com benefícios sociais e ambientais

É inegável que dar atenção às questões ambientais e sociais tem tido uma grande relevância para o mercado corporativo nos últimos anos, gerando benefícios mensuráveis junto aos retornos financeiros positivos para uma empresa. Por esse motivo, órgãos públicos e instituições privadas têm dado maior importância às ações que promovem questões socioambientais, desde atitudes básicas até soluções mais complexas. Avaliando toda a cadeia que envolve o mercado de soluções de impacto positivo, surgem os chamados investimentos de impacto, que buscam investir em negócios e startups que impulsionam a inovação e a criatividade com base nas questões sociais e ambientais.
Em entrevista, Jaana Goeggel, investidora e conselheira de startups no Brasil e na Europa, e co-fundadora da Sororitê Angel Network, afirma que enquanto os investimentos tradicionais se concentram principalmente em métricas financeiras como retorno sobre investimento (ROI), os investimentos de impacto utilizam indicadores adicionais para avaliar o sucesso. No caso da Sororitê, ela aponta que há a promoção da diversidade e inclusão no mercado, apoiando empresas que estão desafiando as normas estabelecidas e criando oportunidades para grupos sub-representados.
Segundo a investidora, a principal motivação para a criação do fundo foi a percepção de que havia uma lacuna significativa no mercado de venture capital no que diz respeito ao investimento em startups lideradas por mulheres e equipes diversas.
“Observamos que esses grupos enfrentam barreiras consideráveis para obter investimento, apesar de demonstrarem um potencial notável para inovação e crescimento. No Brasil 2% das startups investidas são lideradas por mulheres e elas receberam apenas 0.04% do capital investido, segundo dados do Distrito”, comenta Jaana.
Segundo ela, a diversidade não só promove a equidade e a inclusão, mas também leva a melhores resultados de negócios. Estudos como o da BCG (Boston Consulting Group) mostram que equipes diversas tendem a ser mais criativas, inovadoras e capazes de tomar decisões mais eficazes. O mesmo estudo indica que, por exemplo, startups fundadas ou co-geridas por mulheres geram 10% a mais de receita a longo prazo.

“Com essa visão, decidimos criar uma rede de investidores mulheres que pudesse fazer a diferença, promovendo a diversidade de gênero no ambiente de startups. Nosso objetivo é incentivar mais mulheres a serem investidoras porque acreditamos que só com diversidade entre quem dá cheques e decide sobre investimento que vamos ver decisões mais diversas e mais investimento nas mãos de fundadoras mulheres. Só 3% dos fundos de venture capital são liderados por mulheres. Ainda existe muito campo para ser conquistado”, destaca Jaana.
Como critérios utilizados para selecionar os projetos ou empresas para investir, Jaana aponta que a equipe utiliza um processo estruturado, garantindo que todos estejam alinhados com a tese de promover a diversidade de gênero no time fundador. Ela ressalta que é necessário que todas as startups que se inscrevem na base sejam convidadas para uma primeira conversa.
“Nós fazemos questão de passar um feedback para todas elas, pois muitas vezes somos os primeiros investidores com quem estão falando. Esta conversa é um passo importante para passar conhecimento sobre a indústria de venture capital para as fundadoras mulheres, que muitas vezes têm menos acesso a mentores e networking no mercado”, esclarece.
O principais critérios de análise incluem:
Time: pelo menos uma mulher no time fundador, time com expertise complementar e muita paixão pelo problema que queiram resolver;
Mercado: diagnóstico de setor, mas importante que seja um problema relevante em um mercado gigante;
Modelo de negócio: baseado em tecnologia e altamente escalável;
Estágio: estágio inicial com primeiros clientes pagantes, rodada pre-seed.
Obviamente, para chegar na etapa de análises de critérios, é necessário que se tenha o primeiro passo, ou seja, identificar startups lideradas por mulheres, visto que boa parte dos cargos de liderança nas corporações são comandados por homens. Para enfrentar esse desafio, Jaana destaca que a equipe está sempre atenta a eventos do ecossistema ou eventos de matchmaking para conectar com fundadores e organizações em busca de talentos e soluções criadas pelo público feminino.
Além disso, ela destaca que convencer investidores e stakeholders da importância e viabilidade dos investimentos de impacto, especialmente para aqueles acostumados com investimentos tradicionais, também são etapas desafiadoras do processo. Por esse motivo, a educação se tornou um pilar fundamental para a rede Sororitê, que criou uma comunidade acolhedora onde cada membro aprende e se desenvolve por meio de networking e troca de experiências.
“É importante para as mulheres perceberam que elas têm poder e que, juntas, podemos ter um impacto muito maior e realmente trazer uma mudança no ecossistema. O empreendedorismo é o motor do desenvolvimento do Brasil, impulsionando a economia e promovendo soluções inovadoras para desafios locais e globais. Precisamos de novos olhares para velhos problemas; se sempre os mesmos grupos recebem investimentos, não podemos evoluir de maneira significativa. Investir em startups lideradas por mulheres ou times diversos não só promove a equidade e inclusão, mas também potencializa o impacto socioambiental positivo. Dessa forma, contribuímos para a criação de um ecossistema mais justo e inovador, onde todos têm a oportunidade de prosperar”, pontua Jaana.
Um olhar para a comunidade
Diferente da proposta de investimentos em negócios fundados por mulheres, mas ainda com um propósito social de impacto positivo, Andreza Delgado, co-criadora do PerifaCon, primeira convenção nerd das favelas, e criadora do portal PerifaCon, site voltado para a cultura pop, conta que é importante ter investidores que apoiem iniciativas de impacto. Ela conta que a ideia do projeto surgiu há 20 anos, em meio ao desejo de conseguir acesso às grandes convenções.

“Queríamos muito, de alguma forma, colocar os trabalhos dos nossos amigos e colegas em uma convenção. Isso se concretizou a partir do Beco, uma das partes que mais gostamos do evento. A motivação principal era conseguir acessar essas grandes convenções. Sabemos que é um desafio para a iniciativa privada apoiar projetos oriundos da periferia. Enfrentamos preconceitos ao tentar mostrar que lugares escassos também podem produzir grandes resultados. Quando conseguimos apoio de marcas, sejam multinacionais ou pequenas empresas, mostramos que é possível apoiar projetos de todos os tipos na periferia. Não é apenas sobre nós, mas sobre a mensagem de que é possível realizar grandes coisas sem uma grande marca vinculada”, conta Andreza.
Ela compartilha que, para manter e executar nossos eventos, a equipe do PerifaCon busca investir em escolas, empregando iniciativas que expandem as suas ações. Ela destaca ainda que acredita no poder do Estado, porém, muitas vezes, existem recursos e contatos que a iniciativa privada pode fornecer, tornando o processo mais complexo.
“Um exemplo interessante foi a mobilização da AmBev no Rio Grande do Sul, disponibilizando recursos e mão de obra. Além da questão financeira, sabemos que é importante trazer investimentos para as comunidades. Isso é essencial para os nossos projetos com as escolas, pois não apenas atendemos à comunidade, mas também promovemos a produção de projetos e ideias de carreira. Isso cria novas possibilidades para essas pessoas e para o mercado”, compartilha.
Andreza destaca ainda que os parceiros ao longo da história do projeto têm se desafiado positivamente, experimentando desafios muito bons para o projeto.
“Fortalecemos nosso evento e diversas iniciativas importantes, como a entrega de projetos nas escolas e a produção de conteúdo audiovisual”, completa.