Padrões de consumo: gerações mais jovens tendem a consumir menos bebidas alcoólicas
Especialistas compartilham um panorama sobre hábitos de consumo mais saudáveis da geração Z

O padrão de consumo das gerações vem se transformando ao longo das décadas, mudando o tipo de produto, serviço e até mesmo o comportamento da sociedade, podendo variar de acordo com a formação sociocultural de cada indivíduo. Essa realidade atinge a população e acaba guiando tendências de vários segmentos de mercado. Podemos observar que quando o assunto é alimentação e rotina saudável, tudo se torna ainda mais distante, visto que estudos comprovam que as gerações acima de 50 anos de idade apresentam um índice de consumo de álcool e cigarros bem acima das gerações mais jovens.
Uma matéria produzida pela BBC News Brasil demonstra essa diferença, como um estudo sobre comportamento de bebida no Reino Unido que mostra que entre a geração de 16 a 25 anos de idade, cerca de 26% não consomem álcool. Por outro lado, entre as pessoas com 55 e 74 anos de idade, cerca de 15% consomem bebidas alcoólicas. Para os americanos, a diferença de consumo de bebidas alcoólicas, mostra que pessoas de 35 a 54 anos de idade estão mais dispostas a beber do que os jovens da geração Z.
No Brasil, Raquel Dommarco, especialista em tendências na WGSN, empresa líder em tendências de comportamento e consumo, afirma que os hábitos de consumo de bebidas alcoólicas têm reduzido devido a múltiplos fatores. O primeiro deles é a crise do custo de vida e a priorização do bem-estar, passando pelo movimento 'sober-curious' – que, inclusive, já está chegando ao público mainstream. Ela ressalta que um estilo de vida mais moderado em relação ao consumo de álcool também traz uma percepção de maturidade, o que ajuda a explicar o porquê dos jovens demonstrarem um comportamento mais sóbrio em suas experiências de vida noturna.
Segundo Raquel, mesmo quando sóbrios e moderados, os jovens ainda querem se divertir, relaxar, socializar e se sentir bem. Diante desse novo padrão de consumo, ela afirma que o consumo global de bebidas com zero ou baixo teor alcoólico deve aumentar em um terço até 2026, e 41% destes consumidores estarão apenas buscando substituir, evitar o álcool em determinadas ocasiões por motivos diversos, da sustentabilidade à integração social.
“Pensando no crescente foco da Geração Z em práticas de bem-estar, estamos observando que algumas marcas já estão posicionando rituais pessoais de consumo como parte do autocuidado – uma jogada inteligente, pois os consumidores continuam investindo nas rotinas restauradoras de cuidados pessoais que adquiriram durante a pandemia. Beber sozinho, em geral, é uma atividade desaprovada, mas as empresas que produzem bebidas de baixo ou zero teor alcoólico estão reformulando esse momento como uma chance de realizar um "reset" mental, emocional e até espiritual, enquanto relaxamos com uma bebida na mão”, comenta.
André Carvalhal, escritor, especialista em comportamento e design para sustentabilidade, afirma que uma pesquisa recente realizada pela Covitel no Brasil, mostra que pela primeira vez os jovens não ocupam o topo da lista que consomem mais bebidas alcoólicas. Segundo ele, desta vez são as pessoas com faixa etária mais alta, e esse dado aponta sim uma mudança de comportamento. Ele explica que esses hábitos podem ter mudado ao longo dos anos devido a revolução digital, que acabou impactando muito esse comportamento dos jovens por conta da informação e da consciência adquirida por meio da tecnologia.
Ele esclarece que isso pode ser resultado do medo da exposição nas redes sociais e até mesmo sob a questão da dopamina, que antigamente os hábitos de consumo de drogas e álcool eram uma forma de alcançar sensações que hoje, de alguma forma, os jovens conseguem alcançar por meio da tecnologia. André ressalta que isso pode estar relacionado à necessidade de controle e às incertezas do futuro, fazendo com que os jovens estejam mais centrados e conscientes. Outro fato que ele aponta é devido às gerações mais novas serem muito mais questionadoras, buscando equilíbrio e o melhor desempenho em todas as áreas da vida.

“Acredito que isso pode impactar não só o futuro mas o presente. A gente vê a mudança de comportamento e de hábitos que tem impactado não só o setor de eventos, entretenimento, programas e opções de lazer, que se conectam mais com esse público, mas a mudança no mercado de bens de consumo e serviços, que promovem até mesmo produtos com baixo teor alcoólico ou zero álcool”, comenta André.
Um fato que pode ter intensificado essa mudança de comportamento foi a pandemia de Covid-19 que, segundo Raquel, a pandemia foi um grande potencializador e dinamizador de tendências de consumo e comportamento. Ela aponta que, especificamente nos EUA, estudos mostram como os hábitos de consumo pandêmicos acabaram acelerando o movimento 'sober-curious'. O estudo de 2021, apresenta um aumento de 41% no número de dias em que mulheres estadunidenses bebiam. Essa situação, que demonstra um padrão de consumo de álcool problemático, acabou impulsionando uma reação contrária desse público, que passou a explorar produtos e estilos de vida com menor teor etílico.
André afirma que durante a pandemia, pesquisas apontaram um aumento significativo de consumo de bebidas em todas as faixas etárias, e após a pandemia, a queda no consumo. Ele acredita que esse padrão de consumo se caracteriza menos como uma macrotendência, uma coisa passageira, e tem mais a ver com a mudança de comportamento a longo prazo.
Raquel afirma que a Geração Z está gastando mais tempo e dinheiro na saúde preventiva, buscando tomar medidas para envelhecer de forma saudável a partir dos 20 anos.
“Para este grupo é mais importante manter uma visão holística da sua saúde e procurar produtos e experiências dedicadas ao descanso com foco em sua saúde física, emocional e mental, prevenindo futuros problemas, do que contar apenas com procedimentos médicos tradicionais”, ressalta.
Por outro lado, quando se trata da Geração Z, é importante entender, que parte da busca pelo que eles entendem como autocuidado tem a ver com a busca por novos tipos de estímulo. Embora muitas vezes considerada a geração mais saudável, ela afirma que este grupo também tem seus vícios.
“Fumar é um hábito que tem voltado, tanto cigarros como vapes, e ficar sem fazer nada na cama (chamado de 'bed rotting') é considerada a mais nova forma de autocuidado. A questão é que não necessariamente a Geração Z vê este tipo de hábito como ruim para eles. Numa pesquisa nos EUA, 73% disseram que comer 'junk food', por exemplo, pode ser uma forma de autocuidado também. O que temos visto de empresas no segmento de bem-estar que estão à frente nesse sentido é a orientação dos consumidores por meio do 'detox' de dopamina ou redução da tolerância, à medida que esses jovens procuram relações mais saudáveis com o uso de substâncias”, conclui Raquel.