Quiet Luxury: a discrição que redefine o luxo no mundo da moda

29/8/24
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Publicado por 
Redação Start

Enquanto marcas ajustam suas estratégias, o luxo silencioso valoriza a qualidade e atemporalidade, conquistando um nicho que busca exclusividade sem ostentação

Foto: Unsplash
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Em um mundo onde o exibicionismo e o consumo excessivo dominam as redes sociais e as vitrines das lojas, uma nova tendência que tem ganhado força entre os consumidores mais exigentes é o oposto disso. Com produtos mais discretos que demonstram apenas a sua alta qualidade, o quiet luxury, ou seja, luxo silencioso, diferente dos designs mais extravagantes, valoriza a discrição e a atemporalidade, com uma simplicidade que se sobressai e detalhes mais refinados e sofisticados.

Essa tendência tem, de certa forma, moldado o mercado de moda, especialmente o mercado de luxo. Para falar sobre o tema nada melhor do que conversar com profissionais que atuam no setor e entendem todas as particularidades e processos de tendências fashion. Bruno Castilho Ribeiro, designer de moda e criador de conteúdo, inicialmente explica que não acredita que o quiet luxury seja uma tendência de moda e sim um meio de vida. 

A partir disso, ele aponta que as pessoas adeptas a esse movimento procuram peças de extrema qualidade, principalmente para o seu dia a dia, mas também se estendendo a roupas mais formais, trazendo a exclusividade no design como foco das peças, mas sem ostentar as logos de grandes marcas, dando ainda mais sentido a tradução do nome, luxo silencioso. 

Foto: Arquivo pessoal - Bruno Castilho
“Ao meu ver, a principal diferença do quiet luxury para as outras tendências talvez seja a atemporalidade, já que ele não é atrelado a apenas uma peça de roupa, coleção ou temporada, e sim a um forma de consumo. Já o Old Money se assemelha mais ao Quiet Luxury no sentido de ser um meio de vida e não uma tendência, porém a diferença principal é o fato dele ser totalmente relacionado ao estilo dos herdeiros de gerações e a maneira como se vestem, independente se ostentam ou não”, destaca Bruno.

Assim como Bruno, Jordana Di Paula, fundadora e curadora do brechó de luxo Jords, e do Nova Rica Brechó, não acredita que o quiet luxury vá se tornar uma tendência maior, visto que esse estilo conquista quase que exclusivamente pessoas que estão acostumadas com roupas mais minimalistas, diferente de pessoas que gostam e se sentem bem com logos bem marcadas e estampas extravagantes.

Foto: Divulgação - Jordana Di Paula
“Uma cliente que usa, por exemplo, uma roupa da Loro Piana, que custa 6 mil euros e que não tem o preço estampado em nenhum lugar, é um público muito específico. Esse é um segmento mínimo da população que tem esse dinheiro e que não se importa se as pessoas não sabem que ela gastou tanto. A grande maioria das pessoas, quando gasta 6 mil euros em um casaco, quer que isso esteja evidente, nem que seja em um detalhe, para justificar o gasto”, destaca Jordana.

Jordana entendeu que seu mercado nichado em bolsas de luxo atende diferentes públicos. Por esse motivo, decidiu separar seus empreendimentos entre um brechó focado em pessoas que buscam marcas e grifes mais conhecidas, como Yves Saint Laurent, Dolce & Gabbana e Gucci, marcas que claramente já possuem um público que gosta e se sente bem em estampar logos nas suas produções por meio das peças.

“Como o meu brechó é muito focado no meu gosto pessoal, que é discreto nesse sentido de não gostar de logos, eu sempre faço enquetes falando que acho que as coisas não devem ser exageradas. Por exemplo, quando uma pessoa mistura um cinto da Gucci, uma blusa da Valentino, uma bolsa da Chanel e uma piranha da Prada, isso acaba ficando exagerado. Meu público é bem moldado de acordo com meu gosto. Eu, particularmente, não gosto de coisas com muitos logos chamativos, e isso influencia sim as pessoas que me seguem. Já no meu outro brechó, que é o Nova Rica Brechó, acabo atraindo um público um pouco mais emergente, que não compra bolsas como Birkin ou Kelly”, destaca Jordana.

Jordana afirma ainda que as pessoas que estão começando no mercado de luxo têm uma atração por logos, e já aquelas que estão há mais tempo no mercado e que já compraram suas primeiras peças com símbolos há bastante tempo buscam peças mais discretas, especialmente de marcas mais caras, como a Hermès, que, além de não ter o logo estampado, também têm uma qualidade superior.

Falando em qualidade, Bruno aponta que, sem dúvidas a qualidade dos materiais, corte, modelagem são os pilares que permitem identificar se uma peça traz a essência do quiet luxury ou não, mas de longe o fator principal é a questão da logo exagerada e também do comportamento de quem está utilizando a roupa e/ou acessório, que de maneira alguma buscam ostentar com elas.

“Acredito que seja possível, mas o próprio Quiet Luxury, leva o Luxo no nome, então seria mais como adotar uma estética minimalista, procurando investir em peças com melhores acabamentos e materiais, fugindo da massificação das fast fashion e apostando no design autoral, com marcas como Misci, Cris Barros, Igor Dadona, entre outras nacionais, sem comprometer tanto o orçamento, como comprar na Loro Piana, por exemplo”, ressalta Bruno.

Ele explica ainda que já há algum tempo, o quiet luxury vem fazendo algumas mudanças no mercado, principalmente em marcas como a Versace por exemplo, que sempre teve sua estética bem definida com muitas estampas e a medusa. Apesar disso, de 2021 para cá Bruno conta que a marca vem apostando num minimalismo atrelado a sua identidade, com cores mais sóbrias, pouca logo e um design mais limpo. 

Outro grande exemplo é a ascensão da Bottega Veneta e seu intrecciato impecável, a mudança na direção criativa da Gucci, trazendo a visão de Sabato di Sarno para a marca e apostando em peças com menos informação e cortes mais retos. Além disso, o fato da Prada e da Miu Miu não saírem do top 3 marcas mais quentes da The Lyst Index, isso tudo tem influência comportamental do quiet luxury.

Jordana complementa ainda que tem percebido uma certa mudança trazida pela tendência do quiet luxury, que é o desejo por tons mais neutros. Mesmo diante disso, ela destaca que ainda existe uma grande quantidade de pessoas que optam por exibir o logo das marcas de luxo, que são mais caras. 

Ela explica ainda que um dos fatores que têm influenciado o quiet luxury são os criadores de conteúdo e consultores de moda, que tem ensinando o público a observar o acabamento interno das roupas, a costura e estampas alinhadas, ou quando uma roupa não veste bem determinado tipo de corpo. Segundo ela, as pessoas têm aprendido muito sobre isso de forma gratuita na internet, e isso tem influenciado o mercado, por meio de um movimento forte em direção à elegância, à feminilidade, com roupas que caem bem sem necessariamente mostrar muito do corpo.

"Acredito que as marcas de quiet luxury sempre foram assim, e quem consome já conhece essa estética. Por exemplo, peças da Chanel podem não ter o logo visível, mas o design é inconfundível. Novas marcas de luxo talvez precisem se adaptar, mas, em geral, o luxo já tem uma assinatura de estilo. Algumas marcas, como a Gucci, parecem estar diminuindo o uso excessivo de logos, mas isso será gradual, pois muitos clientes ainda buscam essa ostentação. Marcas como Hermès, que já são discretas, não precisam mudar sua abordagem", comenta Jordana.

Sinceramente, não acredito que essa tendência do quiet luxury vá abranger muita gente, porque é uma porcentagem mínima da população que tem condições financeiras de adquirir algo muito caro, sem que isso seja evidente. Por exemplo, no público masculino, talvez alguém compre um sapato da Zegna, uma marca italiana centenária, que tem um modelo de sapatênis específico com um detalhe em "X" na frente. Quem conhece a marca sabe que aquele sapato é da Zegna, mesmo sem estar escrito. Mas não acredito que esse mesmo público compraria outro sapato da marca que não tivesse esse detalhe identificável.

Para Bruno,  o quiet luxury sempre existirá, assim como já existe há anos, mas o termo sem dúvidas popularizou esse comportamento, transformando em uma estética de moda, propondo a busca por peças de maior qualidade e atemporais.

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