Yanomamis: conheça projetos que têm buscado mudar o cenário nas comunidades indígenas

14/3/23
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Publicado por 
Redação Start

A forte presença de garimpos na região é a principal causa da crise humanitária. Entenda qual a origem da situação

Foto: Unsplash
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A região norte do país passou por uma série de movimentos de ocupação ao longo do tempo, desde os primeiros séculos de colonização até os dias atuais. Borracha, madeira, soja, minérios, pecuária ou simplesmente a conquista do sonho da posse de terras são os principais motivos que levaram milhares de pessoas a ocupar a região. 

Além dos movimentos de ocupação que antecedem os séculos XIX, pudemos observar em documentos históricos o primeiro fluxo migratório que houve durante o período de exploração da borracha. As atividades ocorreram em toda a região amazônica, mas principalmente nos estados onde estavam os centros de comercialização do produto que enriqueceu a região na época. A exploração durou entre o final do século XIX e foi perdendo força em meados dos anos 1980.

Todos os movimentos migratórios fizeram parte da construção da identidade cultural da região norte do país, mas sem perder a principal característica da região, baseada na cultura indígena. Mas com isso, vieram as consequências da ocupação e as ameaças à floresta amazônica, dando origem às iniciativas de preservação dos povos e da floresta. Como exemplo, podemos citar as ações do maior ambientalista do Brasil, Chico Mendes, que lutava pela conservação da floresta amazônica e os direitos dos seringalistas.

Em outro cenário, ocorrido no final dos anos 60, período em que havia um regime militar presente no Brasil, houve uma série de iniciativas em busca de ocupar a região. As iniciativas carregavam a ideia de que a região deveria ser povoada, “Integrar para não Entregar”, para não acabar perdendo o território com a ameaça da internacionalização. Esse movimento pode ser considerado um dos mais persistentes, que é a ocupação em busca das riquezas de minérios presentes na Amazônia.

Um conteúdo publicado pelo Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia, instituição brasileira de pesquisa que promove a conservação e desenvolvimento sustentável na Amazônia, conta detalhes de cada período. Os movimentos para povoar tinham o objetivo de explorar as riquezas da região que acabaram dando origem aos garimpos. Além das iniciativas de garimpo, o governo da época deu início à criação da rodovia Transamazônica, que dá acesso do estado ao restante do país, não limitando apenas aos transportes fluviais e aéreos.

Diante às iniciativas de exploração de minérios, foram oferecidas entre os anos 70 e 80 terras para os colonos do sul do país para povoar o sul do Amazonas. Conforme mostra o documentário Braços Fortes, co-produzido pela Amazon Play e exibido pela TV Encontro das Águas, afiliada à TV Brasil, a iniciativa buscava impulsionar a agricultura e pecuária local, que até então era quase inexistente na região.

Quem pôde observar em tempo real, em documentos históricos ou documentários, se chocou ao ver as imagens da Mina de Serra Pelada, localizada no Pará. A região recebeu milhares de pessoas em condições desumanas, em busca de riquezas da exploração de ouro e outros minérios.

Garimpeiro e policial militar entram em conflito no garimpo de Serra Pelada. Fotografia: Sebastião Salgado. | KARONTE: AKA Museu de Imagens

Conforme a lei 7.805/89, as atividades de garimpo no Brasil são permitidas, mas exigem alguns requisitos para serem legais. A permissão é concedida pelo prazo de até cinco anos, sendo necessária a renovação, não podendo exceder cinquenta hectares de área explorada, e nem presentes em áreas de conservação. Mas, mesmo com as exigências, os garimpos ilegais se proliferam nas regiões, ocupando de forma desenfreada e sem controle intenso do poder público e de instituições ambientais, devido às dificuldades logísticas.

Garimpo e as comunidades indígenas

Uma matéria publicada pelo National Geographic Brasil mostra que o Rio Madeira, um dos maiores rios do mundo que percorre cerca 3.315 km até chegar ao Rio Amazonas, sofre com uma série de ameaças na sua extensão. Podemos citar como as principais ameaças as barragens hidrelétricas, urbanização, sobrepesca e garimpo ilegal.

Em 2021, a Polícia Federal deflagrou uma operação de repercussão internacional, apreendendo centenas de balsas e dragas de garimpo ilegal no Rio Madeira, próximo ao município de Autazes, interior do Amazonas. O garimpo ao longo do rio não é uma novidade, e a região sofre com isso há décadas, mesmo com a fiscalização de órgãos como o Ibama, Polícia Federal e Forças Armadas.

Em entrevista para a plataforma Unidades de Conservação do Brasil, o deputado estadual do Amazonas, Sinésio Campos (PT), fala que um dos maiores gargalos da exploração mineral no estado é a presença de potenciais campos de exploração em reservas indígenas. Outros minerais de potencial exploração na região que geram discussões são o nióbio e o potássio, que estão presentes na reserva mineral localizada nos arredores do município de São Gabriel da Cachoeira, que faz fronteira com a Venezuela e Colômbia, e abriga parte das aldeias Yanomamis.

Em São Gabriel da Cachoeira existem cerca de 23 povos indígenas diferentes, que pertencem às famílias linguísticas Tukano Oriental, Aruak, Yanomami, Japurá-Uaupés (Maku) e Tupi, que falam até 23 línguas indígenas distintas. A língua Tupi Nheengatu é falada por parte dos povos Baré, Werekena e Baniwa, que vivem às margens do Rio Içana, conforme explica a dissertação Território e línguas indígenas em São Gabriel da Cachoeira-AM

O município se destaca por ser a cidade mais indígena do Brasil, tendo entre os quase 45 mil habitantes cerca de 90% considerada indígena, segundo dados do IBGE. Em 2021, cerca de 40,7% do garimpo nacional estava presente em áreas de conservação e 9,3% em terras de demarcação indígena. Em uma década foi possível observar um crescimento de 495% da presença dos garimpos nos territórios das tribos Kayapó e Munduruku, no Pará, e Yanomami, no Amazonas e Roraima, segundo levantamentos do Mapbiomas.

Recentemente foi possível observar uma explosão de notícias acerca da tribo Yanomami, que sofre uma crise humanitária devido às fortes invasões do garimpo ilegal em terras indígenas. As práticas do garimpo causam danos irreparáveis ao meio ambiente, como o desmatamento de áreas de preservação, desvio de rios, aterramento de rios, contaminação do solo, ar e águas com o uso de metais pesados, como o mercúrio e, como consequência, a morte de vários animais presentes nas proximidades.

A região atingida pela crise está localizada entre o estado de Roraima e Venezuela, mais precisamente na região de Surucucu, interior da terra indígena Yanomami. A região montanhosa fica a cerca de 1 mil metros de altitude e abriga o 4º Pelotão Especial de Fronteira do Exército Brasileiro, e outras entidades federais, como a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA) e a Fundação Nacional do Índio (FUNAI).

Devido a presença de garimpos ilegais, as comunidades indígenas ficaram à mercê sem opções de alimentação de caça, pesca e o acesso à água potável. Além de tudo, ainda existe um sentimento de insegurança e violência extrema causada pelos garimpeiros. O uso do mercúrio nos garimpos do Brasil para a extração do ouro é algo comum e coloca em risco a saúde física e neurológica de pessoas das comunidades presentes nos locais de exploração. 

O metal causa uma contaminação massiva de peixes e o risco de intoxicação para quem se alimenta deles. As consequências variam entre dores no esófago, diarreia e sintomas de demência, letargia, problemas dentários e falhas na memória. Para o garimpeiro, a única função que importa é a capacidade do metal de unir os grãos de ouro, que ficam mais nítidos e fáceis de serem manuseados e separados dos demais detritos da terra. Após esse processo, o ouro é jogado nas betoneiras e diluído em água e mercúrio para que fique mais limpo. O metal passa por dois processos de queima junto ao mercúrio para se tornar mais puro e, assim, aceito pelos ourives e designers que consomem ouro ilegal.

A crise causada pelo garimpo nas terras indígenas Yanomamis comoveu a mídia internacional e mobilizou uma série de iniciativas públicas e privadas para auxiliar a população indígena atingida. Além dos fatores de intoxicação, o garimpo tem muito mais consequências do que é imaginado.  Apesar de não ser uma novidade e ocorrer há no mínimo 30 anos, a situação teve um agravamento significativo no ano de 2018 e explodiu nas notícias nos últimos meses.

Startup busca transformar o cenário das comunidades

A situação de desnutrição extrema tem recebido apoio de muitos órgãos ambientais, empresas públicas e privadas, e startups para melhorar a situação. Esse é o caso da startup Água Camelo, que desenvolveu uma espécie de filtro capaz de tratar até 1 mil litros de água por hora e já funciona com sucesso em alguns estados brasileiros. A mochila de filtragem foi desenvolvida para suprir quatro etapas para tornar a água potável, com captação, transporte, armazenagem e filtragem. 

O produto contém uma membrana de fibra oca, junto ao Kit Camelo, que filtra os protozoários, as partículas de suspensão na água, as bactérias e um ativo especial que elimina os vírus presentes na água.

A startup foi fundada em 2020 e, com apenas quatro meses, já estava presente em sete estados do país, impactando cerca de 4 mil pessoas. Uma matéria publicada pelo Senado Federal mostra que quase 35 milhões de pessoas vivem sem água tratada no Brasil, e cerca de 100 milhões não têm acesso a sistemas de saneamento básico, o que resulta em doenças e até a morte por contaminação.

Foto: Arquivo pessoal | Rodrigo Belli

Após acompanhar uma série de notícias sobre a crise, a startup passou a buscar parceiros que pudessem viabilizar ações para ajudar a comunidade. Após observar a repercussão, o produto social da Ambev, AMA, buscou a startup com o objetivo de alinhar ações de auxílio para a comunidade, que passa por problemas graves com desnutrição aguda devido aos problemas de acesso à água tratada. A partir disso, a Água Camelo passou a montar uma ação para levar o material de filtragem até a comunidade.

Por esse motivo, a startup passou a distribuir 50 Kits Camelo e dois filtros para conseguir gerar impacto e garantir acesso à água tratada para indígenas e comunidades. Rodrigo Belli, CEO e cofundador da Água Camelo, afirma que a startup é focada no mercado ESG, que vende o serviço B2B para possibilitar o acesso à fonte segura de água tratada para as comunidades. O negócio está presente com ações em três diferentes cenários, a floresta amazônica, o semiárido e as favelas.

“A importância das nossas ações, não só para os Yanomamis, mas também para todas as outras comunidades que a gente impacta, nos centros urbanos, no semiárido, na floresta amazônica, é o acesso à fonte segura de água tratada. Acredito que todo mundo que está lendo essa matéria tem um copo de água limpa para beber nas suas casas, e a gente pode até não perceber muitas vezes que isso é um grande privilégio. Uma em cada quatro pessoas no mundo não tem esse direito assegurado e, aqui no Brasil, são pelo menos 35 milhões de pessoas que passam por esses desafios”, comenta Rodrigo.

Ele conta ainda que o processo de escolha das comunidades passa por algumas etapas, primeiro é preciso fazer o diagnóstico e a percepção da necessidade de cada local, a partir do termo WASH (Água, Saneamento e Higiene). Depois é preciso instalar ferramentas e contratar pessoas locais que passam a rodar formulários entre os beneficiários para que sejam avaliados os impactos gerados na comunidade e, por último, são gerados os relatórios com dados para alavancar as metas ESG.

Sobre o processo de escolha das comunidades, Rodrigo explica que existem duas etapas diferentes. O negócio possui um mapeamento de 11 terras indígenas no alto Juruá. A partir do mapeamento, a equipe entra em contato com a população local para entender as necessidades da comunidade e aí sim pôr em prática os projetos prontos para serem efetuados. Outra alternativa são os projetos personalizados que são adaptados conforme a demanda dos parceiros e clientes, que procuram a startup para comunidades e regiões específicas. 

Entendendo as necessidades que vêm repercutindo na mídia com relação ao povo Yanomami e as questões sobre o garimpo que assolam a região norte do país, a Greentech Business surge com soluções para mudar esse cenário. 

Diante dessa realidade e avaliando o potencial das tecnologias sustentáveis de impacto, a Greentech Business surge como uma plataforma para conectar startups e scale-ups e desenvolverem tecnologias verdes no seu negócio. A empresa promoveu uma iniciativa para encontrar possíveis soluções para os problemas de garimpo na região amazônica e, consequentemente, melhorar o acesso à saúde, de forma que convide as grandes empresas a estarem engajadas em questões como as do povo Yanomami.

Entre as soluções buscadas está a utilização de tecnologia para monitorar áreas de preservação, para evitar possíveis invasões de garimpeiros e, até mesmo, problemas como o desmatamento. Outra solução é a apresentação de novas formas de exploração que não utilizam mercúrio, e assim, não contaminam a área. Essas alternativas, além de contribuir para o desenvolvimento sustentável, podem gerar renda para o país, região, população e para o poder público.

Para Tiago Brasil, fundador do Greentech Business e cofundador integrante do Greentech Angels - fundo de investimento anjo dedicado ao tema, a empresa ajuda empreendedores de diversas áreas a colocar soluções em prática e entregar um impacto real para a sociedade. O projeto para a região onde estão localizados os povos Yanomamis pode ir além da comunidade, oferecendo a chance das corporações e instituições entregarem mudanças efetivas e não apenas soluções temporárias.

“Especificamente sobre indígenas vejo muita discussão política, muita conversa do passado e pouco planejamento e ação efetiva em criar um futuro usando ASG. Vejo ainda que as oportunidades são grandes em cada tema, imagine indígenas com tecnologias de ponta. Imagina educação de qualidade para eles e melhoria da qualidade de vida por meio do investimento em tecnologia. Imagine novos arranjos de governança e gestão”, comenta Tiago.

Ao longo dos cinco anos de existência no mercado, a empresa alcançou o nível mundial sempre buscando se manter conectado com empreendedores e crescer por meio da implementação de tecnologias sustentáveis em empresas, governos e investidores. Atualmente, a empresa já conta com mais de 900 soluções recebidas, 75 apresentadas e pessoas de mais de 25 países acompanhando cada solução.

“Convido vocês a conhecerem a plataforma e buscar soluções para problemas de impacto. Exemplo: água - ao acessar a plataforma os usuários podem ver diversas soluções para problemas relacionados à água, escolher, fazer parcerias e resolver problemas. O ideal é identificar problemas da região dos Yanomami’s ou outros povos indígenas em outras regiões e implementar parcerias com empreendedores e detentores das tecnologias sustentáveis que resolvem os problemas”, finaliza Tiago.

Para apresentar soluções, a Greentech Business disponibiliza um formulário de inscrição 100% gratuito para empreendedores que desejam se cadastrar na plataforma. Basta acessar o site e seguir os passos do cadastro. A plataforma irá avaliar novas inscrições ao longo do ano.

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